Precificação deve seguir uma política sólida

Estabelecer uma política sólida para definir o melhor preço para você e para o seu cliente exige mais do que conhecimento em números

Preço é importante para todo varejo. Mas isso não significa que ele deve ser baixo sempre. A estratégia que cada empresa desenvolve para estabelecer o seu preço é o que realmente vai importar, tanto ao cliente que vai escolher a loja, quanto para o empresário que busca o lucro. Por isso, estabelecer uma política, estratégia ou posicionamento de preço – independente do nome que se dê – faz parte da construção de qualquer empresa.

“Estratégia de preço é o posicionamento da empresa com relação ao preço que vai atuar”, afirma o coordenador dos programas de MBA do Insper, Silvio Laban, que acha o conceito de valor fundamental. “Preço justo é o que você paga. Valor é o que recebe pelo que pagou. Passa a ser justo à medida que o consumidor entende que está recebendo o valor pago no preço”, explica.

O gerente sênior da consultoria da Ernst & Young (EY), Gustavo Guazzelli, concorda que política de preço é determinar quanto vale um produto ou serviço oferecido ao consumidor final. “O preço está totalmente atrelado à proposta de valor e posicionamento de uma organização e, caso seja um varejista que possua loja física, o preço deve estar alinhado com a ambientação e formatação da loja.” É como se o cliente pudesse votar na loja que mais o agrada com a sua carteira, compara o economista da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), professor Eduardo Luzio. “Por que o cliente prefere a loja A ou B? Tem a ver com conveniência, preço e mix. Produtos certos com preços atraentes.”

E para ser chamativos, os preços e os produtos precisam estar dentro do contexto do local e do mercado em que a loja está atuando. “Por exemplo: uma farmácia em São Mateus (bairro da periferia da zona leste de São Paulo) é diferente de um ponto de venda (PDV) que está no Brooklin (bairro de classe média da zona sul de São Paulo)”, aponta o consultor do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de São Paulo (Sebrae-SP), José Carmo Vieira de Oliveira. Já as lojas da Drogaria Onofre têm posicionamento diferente das farmácias de bairro. “Cada empresa tem de ter uma política de preço conforme sua estratégia organizacional. A estratégia é o que determina o preço”, conclui Laban.

Clareza para o consumidor

Para entender como o posicionamento de preço pode definir o perfil da sua loja, Guazzelli exemplifica com o caso do supermercado Walmart, que por muitos anos se posicionou como uma loja de preço baixo, inclusive com o slogan em seu logotipo “Always Low Price” (Sempre preço baixo) e “Save money. Live Better” (Economize dinheiro. Viva melhor), deixando claro aos seus clientes que eles têm a proposta de oferecer o melhor preço. Por outro lado, se utilizarmos o exemplo oposto, o varejo de luxo, em que o preço é formatado por uma estratégia de valor, a política de preço posiciona uma marca como premium e passa a mensagem ao consumidor do quanto determinado produto ou serviço é valioso.

Além do fator determinante no posicionamento da marca ou empresa, complementa Guazzelli, existem outras variáveis que determinam a importância da política de preço, como estratégia de atratividade, aumento da frequência de visitas de consumidores, facilidade para entrada em novos mercados ou novas linhas de produtos e serviços, ou ainda “desovar” estoques de altas quantidades de produtos, elevar as vendas e o giro de um determinado produto, competir com a concorrência, flexibilidade na prestação de serviços, relacionamento e parcerias de longo prazo, entre outros fatores.

Em varejo que atua com diversas categorias, como é o caso das farmácias, o empresário deve definir se a política de preço vai ser igual a todas as categorias ou não. No âmbito dos medicamentos, a loja pode ter uma política para os que exigem receita e outra para os Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), por exemplo. Em higiene e beleza, há uma gama enorme de diferentes produtos para definir o posicionamento. Tudo depende da estratégia. A forma como vai estruturar e organizar os preços tem de ter como objetivo atrair o maior número possível de consumidores, maximizando o retorno para a empresa. “Se higiene e beleza são atrativos de tráfego, a decisão sobre o preço é uma. Se esses produtos são geradores de margem, a tática é outra. Estratégia de preço é importante para qualquer empresa que quer atrair clientes e maximizar resultados”, reforça Guazzelli.

Um exemplo clássico de produto que atrai tráfego é a esfirra do Habib’s. Por ter um preço baixo em comparação com os concorrentes da marca, leva o cliente até a loja. Uma vez convencido de comer no restaurante por conta do baixo preço de um item, o consumidor vai pedir outros produtos além da esfirra, como suco, quibe, sobremesa, etc. Mesmo se não ganhar nada vendendo esfirra, o Habib’s tem lucro ao vender outros produtos com boa margem e grande fluxo na loja. “Essa mesma estratégia serve para a farmácia. O gestor só precisa achar a esfirra que o cliente quer”, aponta Luzio.

O economista explica que os produtos atraidores de fluxo são grandes itens de consumo. Por isso, ressalta Luzio, o gestor tem de conhecer seu cliente, o que ele consome e quando vai à sua loja.

A época do ano e o clima são outros fatores que interferem na política de preço, pois os produtos sazonais ganham e perdem valor de acordo com essas variações. No verão, explica Luzio, o consumidor tem disponibilidade para pagar um preço no protetor solar ou no inseticida, por exemplo, mas não é o mesmo que ele vai desembolsar em época de frio. Para o farmacêutico, o inverno também é importante, pois os resfriados e gripes são bem mais frequentes. “Isso também vai trazer o cliente para a loja”, endossa o consultor do Sebrae-SP.

Construindo números

Depois de decidir qual vai ser a política de preço da empresa, o gestor tem de imprimir isso no que será praticado na loja. Conceitualmente, explica Laban, o preço é constituído de estrutura de custos, objetivos (resultado), concorrência e demanda. É comum encontrar empresas que colocam uma margem fixa em cima do preço de custo e acham que está tudo resolvido. Todos os especialistas concordam que esse modelo é ultrapassado. Como vimos, o valor de cada produto da loja é mais do que o preço dele. Oliveira ensina que, para decidir a quanto cada produto será vendido, é preciso achar o ponto de equilíbrio, ou seja, considerar todos os custos inseridos na venda do produto. A partir da importância encontrada, o gestor estabelece a margem.

Mas nem sempre a margem desejada é viável. Ficar de olho na concorrência pode ajudar a estabelecer qual o melhor preço para a sua realidade. “É muito difícil dizer quanto a concorrência pode influenciar nos preços adotados por uma loja, uma vez que existem diversas variáveis que impactam nesta questão”, indica Guazzelli. Para ele, a presença de varejistas próximos, de varejistas com e-commerce/digital, qualidade do serviço prestado, facilidades de acesso, possibilidades de pagamentos, qualidade da ambientação e layout, poder da marca do varejista, são outros fatores que precisam ser considerados ao estabelecer política de preço e valor. “Vamos supor que existam quatro farmácias a menos de 500 metros da sua loja, com categorias de produtos, serviços prestados e formatação e layout similares, definitivamente preço será um fator importante na decisão de compra do consumidor, embora não sendo o único de importância”, salienta o especialista.

Para Guazzelli, não existe certo ou errado na construção da política de preço. “Isso porque os diversos segmentos do varejo possuem características peculiares de mercado. Além dos aspectos, como sazonalidade, região geográfica, localização e presença da concorrência, possuem impacto direto na precificação”. O gerente da Ernst & Young resumiu de forma simples as principais quatro técnicas que costumam ser utilizadas para essa tarefa. São elas:

Preço baseado em Valor: o preço é formatado predominantemente pela percepção do cliente. Estratégia característica de novos produtos ou serviços inovadores e varejo de luxo.

Preço baseado em Contexto: o preço é formatado conforme o contexto de cada venda. Estratégia muito característica na prestação de serviços.

Preço baseado em Competição: o preço é formatado de acordo com os concorrentes. Estratégia característica em varejos com alta presença de concorrentes e negócios com produtos e serviços com muita oferta similar.

Preço baseado em Custo: o preço é formatado conforme o custo do produto ou serviço, somado a uma margem de lucro que o varejista definir. Estratégia característica dos varejos de móveis e livros.

Desconto para lucrar

Ainda que pareça antagônico, um desconto mal pensado pode ser um tiro no pé. Na hora de precificar, o varejista já deve considerar se é característico do seu negócio dar descontos e seus percentuais. Para que um desconto seja concedido, é preciso que a redução do preço seja muito bem explicada ao cliente. Caso contrário, ela poderá transmitir uma imagem negativa do varejista. “Já estive em livrarias que ao simples fato de perguntar se o vendedor poderia me dar 10% de desconto, recebi um sim de imediato. Existe muito dinheiro na mesa ao falarmos de desconto, o varejista precisa estar atento ao desconto concedido nos seus PDVs e a política de desconto do negócio deve ser considerada na estratégia de formatação do preço”, conta Guazzelli.

Antes de baixar os preços para tirar um sorriso momentâneo do cliente, é preciso saber qual o propósito dessa decisão. Laban explica que o desconto deve estar embutido na estratégia, por exemplo, ele serve para atrair fluxo ou compensar o cliente? O desconto isoladamente, explica, não fideliza. No caso de ter a intenção de criar uma imagem de preço baixo, a loja deve estar voltada para isso, com baixo custo operacional, sortimento reduzido e especializado.

Uma estratégia interessante para ser utilizada pelos varejistas com objetivo de transformar o desconto em uma característica ou diferencial em seu negócio é o desconto progressivo, prática em que quanto maior a quantidade de produtos ou valor comprado, maior o desconto recebido pelo cliente. Desse modo, indica Guazzelli, ao incentivar uma compra maior, o vendedor deixa claro ao cliente a razão do benefício, apresentando uma situação de ganha-ganha.

Uma segunda estratégia utilizada é o desconto para uma próxima compra, estimulando o cliente a voltar. Uma terceira estratégia é incentivar o cliente a acessar os diversos canais de compra que o varejo disponibiliza, como, por exemplo, oferecer um cupom de desconto a um cliente que esteja comprando pelo site da empresa para ser utilizado em uma loja física. “Muitas pesquisas já apontam que o cliente multicanal, ou seja, que compra por vários canais de venda, tem um tíquete médio e um gasto total maior no negócio”, diz Guazzelli.

Mas para não errar na conta, saber na ponta do lápis até onde pode chegar o desconto não depende de estratégia. Conhecer o ponto de equilíbrio dos produtos, ou a média para cada grupo de produtos, é uma conta essencial para não ter prejuízo, segundo Oliveira. Apenas dessa forma o gestor vai saber exatamente o preço mínimo daquele item para a loja não sair perdendo.

 

Por Claudia Manzzano

Novo padrão de consumo

Edição 273 - 2015-08-01 Novo padrão de consumo

Essa matéria faz parte da Edição 273 da Revista Guia da Farmácia.

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