Cinco passos para entender a Substituição Tributária

Entenda tudo o que envolve o regime que recolhe antes o imposto a ser pago

Para muitos contribuintes, o regime de Substituição Tributária (ST) do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) é incompreensível. Sem dúvida, entender as nuances das leis fiscais do Brasil não é fácil, mas nem por isso os contribuintes devem deixar tudo nas mãos dos contadores. O Guia da Farmácia esclarece tudo o que você precisa saber sobre ST em cinco passos.

1. A substituição se aplica apenas a alguns produtos e serviços

No regime regular de tributação, quando o consumidor final faz uma compra e o varejo não emite nota fiscal, o governo deixa de receber o ICMS da última etapa de recolhimento. Para resolver este problema, o governo encontrou uma maneira de antecipar o imposto: a ST, ou seja, regime que antecipa para o início da cadeia produtiva o recolhimento do ICMS. Nesse caso, quando a primeira etapa da cadeia produtiva (geralmente a fábrica) vende o produto, já recolhe o imposto que pagaria normalmente mais os impostos do restante da cadeia. Portanto, o imposto que incide sobre o produto vendido pela farmácia é recolhido pela fábrica antes mesmo do produto ser vendido pelo varejista.

A professora de Direito Tributário da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Maria Leonor Leite Vieira, explica que, inicialmente, este regime foi implementado apenas para categorias específicas de produtos, como automóveis. Com o passar dos anos, novos produtos foram inseridos no regime e, hoje, alguns estados já o utilizam em diversos setores.

Para saber quais produtos estão inseridos no regime de ST, indica a consultora do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, de São Paulo (Sebrae-SP), Sandra Regina Bruno Fiorentini, o contribuinte pode acessar o site da Secretaria da Fazenda do seu estado ou checar a nota de aquisição de mercadoria, em que vem destacado Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços – Substituição Tributária (ICMS-ST). Nesses documentos, constam dados dos tributos pagos no caso de estarem inseridos no regime. Ainda assim, o advogado do escritório Orsini & Schmid, Ivan Schmid, aconselha os contribuintes a sempre consultarem um especialista, como um advogado tributarista ou um profissional habilitado nessa área, pois a legislação é muito extensa e muda com frequência.

O especialista indica que se pode também formular uma consulta perante as autoridades fiscais para obter esclarecimentos e saber se determinado setor/categoria ou produto está inserido na substituição. Mas ele destaca que essas consultas devem ser formuladas com objetividade, precisão e descrição detalhada da situação e do que se busca esclarecer, pois as autoridades não respondem a consultas genéricas do tipo “meu setor/produto X está enquadrado na substituição? Se sim, eu sou o substituído ou o substituto? O que devo fazer?”.

2. As regras para a ST variam de estado para estado

A alíquota de ICMS de cada estado é diferente. E por isso, o valor pago varia bastante. No entanto, o funcionamento da ST é idêntico em todas as unidades da Federação. As diferenças, explica o professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Edmundo Emerson de Medeiros, normalmente estão associadas aos critérios para a fixação da base de cálculo que será adotada pelo substituto tributário (normalmente o fabricante). No caso de medicamentos no estado de São Paulo, por exemplo, adota-se até 30/09/2015: o Preço Máximo ao Consumidor (PMC) fixado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), o preço praticado pelo substituto acrescido do Índice de Valor Adicionado Setorial (IVA-ST) ou, ainda, o valor de referência divulgado pelo Ministério da Saúde para os medicamentos comercializados no âmbito do Programa Farmácia Popular do Brasil.

Preço-base para cálculo da Substituição Tributária

Para cada um dos setores inseridos no regime de Substituição Tributária (ST) há uma entidade que congrega e que vai estabelecendo preço do produto no mercado para que governo não estabeleça alíquota mais alta. No caso do medicamento, é a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamento (CMED) que regulamenta o mercado e estabelece critérios para a definição e o ajuste de preços anual de medicamentos – que passa para a Secretaria da Fazenda de cada estado a lista de preço que será base para a cobrança do imposto.

Fonte: professora de Direito Tributário da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Maria Leonor Leite Vieira

“Normalmente, existem regras que determinam a quebra da cadeia de substituição quando a venda é feita de um estado para o outro (operações interestaduais em contraposição às operações internas, integralmente realizadas no território de um só estado)”, afirma Schmid. Mas há situações em que os estados assinam convênios e protocolos entre si para que a substituição se mantenha quando a cadeia de produção-consumo se inicia em um estado e termina no outro.

3. Entender a mecânica da ST traz benefícios para a empresa

Todos os especialistas concordam que entender o regime de tributação ajuda a loja a ter bons resultados no negócio. Uma das mais simples razões é que, como o valor do imposto é cobrado antes da venda para o consumidor, produto parado no estoque é dinheiro parado. E se não vender, não interessa, é mais prejuízo ainda, pois o imposto já foi pago.

Maria Leonor também destaca que o contribuinte precisa saber fazer escrituração e ver na contagem do estoque tudo que antecipou e o que vendeu. Com o registro, é possível ter garantia de que não está pagando mais imposto. E Schmid aponta que é preciso saber como devem ser preenchidas as notas fiscais e as demais declarações que devem ser entregues mensalmente ou anualmente para as autoridades fiscais, o que depende também de cada produto e legislação.

Inseridos no Simples Nacional

No caso do negócio do contribuinte estar inserido no Simples Nacional (SN) e o produto vendido no regime de ST, ele vai ter de calcular bem o imposto para não pagar duas vezes. Ainda que a alíquota seja única, ele precisa subtrair o imposto que já foi pago no início da cadeia produtiva. Sandra, do Sebrae-SP, exemplifica o funcionamento dos cálculos com o hipotético caso:
Farmácia faturamento ano anterior de R$ 180.000,00.

Anexo I – Simples Nacional – a alíquota cheia é de 4% – composta de (IRPJ/CSLL/PIS/Cofins/CPP e ICMS)
julho/15 = faturamento de R$ 15.000,00.

Deverá separar as receitas/faturamento de revenda de produtos com ST da revenda de produtos sem ST:

• R$ 10.000,00 revenda de mercadoria com ST (ICMS já foi pago/antecipado para o governo), portanto, não deverá pagar novamente o ICMS.
Assim deve solicitar ao contador para deduzir da alíquota cheia do SN o percentual referente ao ICMS.

• R$ 5.000,00 de revenda de mercadoria sem ST – (ICMS não foi pago/antecipado para o governo), portanto, deverá utilizar a alíquota cheia do SN.

EXEMPLO DE CÁLCULO:

• R$ 10.00,00 com ST x R$ 2,75 = R$ 275,00
• R$ 5.000,00 sem ST = R$ 200,00
TOTAL DE IMPOSTO DEVIDO = R$ 475,00

Caso o dono da farmácia não separe as receitas de revenda de produto com ST da revenda de produtos sem ST irá pagar mais imposto. Exemplo:
Faturamento R$ 15.000,00 x 4% = R$ 600,00

Medeiros explica que, independentemente do regime de tributação ao qual esteja submetido o varejista (Lucro Real, Presumido ou SN), os produtos por este adquiridos, na condição de substituído tributário, não estarão sujeitos a uma nova incidência tributária. Ele expõe o exemplo de um varejista optante pelo SN e cuja receita bruta, nos 12 meses anteriores ao de apuração, tenha sido de R$ 1 milhão.

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Nesse caso, explica, o varejista não recolherá 8,28% calculado sobre o seu faturamento (Tabela I da Lei Complementar nº 123/06), vez que antes deverá excluir da apuração os percentuais referentes ao ICMS, Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), cujos recolhimentos já foram feitos antecipadamente pelo substituto. O percentual a ser recolhido pelo substituído sobre o seu faturamento, portanto, será 4,04%. O faturamento pertinente aos produtos não sujeitos à ST do ICMS ou à incidência monofásica das contribuições (PIS e Cofins), evidentemente, estariam sujeitos ao percentual de tributação de 8,28% nesse exemplo.

Varejistas tributados pelo Lucro Real ou Presumido, a seu turno, não recolhem ICMS, PIS e Cofins (nestes dois últimos casos 0,65% e 3% para o presumido e 1,65% e 7,6% para o lucro real, respectivamente) sobre as vendas que realizam na condição de substituídos tributários.

4. ST deve integrar o cálculo feito para o preço final dos produtos

Considerando que na ST geralmente haverá um recolhimento para toda a cadeia, dependendo do modelo utilizado, poderá haver um fator de ajuste para fins de cálculo do imposto, que aumenta, para fins tributários, o valor do produto (base de cálculo), de forma a compensar a ausência de recolhimentos pelos substituídos. Schmid explica que esse fator de ajuste pode ser um percentual ou um valor fixo para determinados produtos constantes de listas oficiais que podem variar em cada estado.

Substituição Tributária pode ser questionada em algumas situações?

De acordo com o advogado do escritório Orsini & Schmid, Ivan Schmid, sim. Segundo o especialista, o método da Substituição Tributária (ST) deve chegar o mais próximo da realidade econômica da cadeia. Assim, quando o fator de ajuste gera um imposto a pagar muito maior do que o total que seria pago por todos os elos/agentes da cadeia, se não houvesse a substituição, então é possível questionar e requerer uma revisão do fator de ajuste para que ele se adapte ao máximo à realidade comercial, reduzindo-se o imposto devido na ST.
Há também situações em que as operações acabam não se concretizando na cadeia por eventos imprevistos, como acidentes, perdas e roubos e, nestes casos, o contribuinte pode também questionar (pontualmente) o recolhimento feito para se ressarcir do imposto pago na ST.

Na ST para frente (isto é, antecipação do imposto), normalmente existe esse fator que reajusta o preço do bem para calcular o imposto do restante da cadeia. Ou seja, mesmo que a mercadoria seja vendida por R$ 100, o valor – para fins de cálculo do imposto sobre as operações posteriores – geralmente é maior. Nesses casos, além dos R$ 100,00 referentes ao preço da mercadoria, o substituto tributário também cobra o valor do imposto do comprador, que seria, no final, o contribuinte substituído. Ou seja, o substituto age como verdadeiro agente arrecadador.

5. Adquira o hábito de consultar um simulador tributário para facilitar as finanças

Para Schmid, qualquer ferramenta tecnológica que auxilie o contribuinte substituto tributário é de grande valia para tornar mais rápida, precisa e organizada a gestão fiscal da empresa. No entanto, como a ST é muito complexa e mutável, é importante tomar o cuidado de atualizar e parametrizar bem os sistemas que estão sendo implementados e utilizados.

Medeiros lembra que o empresário deve estar atento principalmente no momento de opção pelo regime de tributação ao qual estará submetido durante todo o exercício. Apesar de, em geral, o regime do SN ser a opção mais econômica para a maioria das empresas, há casos em que o Lucro Presumido pode ser mais vantajoso. Por isso, uma simulação da carga tributária que considere todos os cenários é imprescindível para que se alcance a menor tributação possível.

 

Claudia Manzzano

 

Análise clínica

Edição 274 - 2015-09-01 Análise clínica

Essa matéria faz parte da Edição 274 da Revista Guia da Farmácia.

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