Ter atenção com as leis é função do varejista

Seguir todas as exigências regulatórias do setor farmacêutico não é tarefa simples, mas respeitar as normas é garantia de trabalhar com tranquilidade e sem riscos de sofrer punição

Abrir uma farmácia pode parecer uma proposta atraente para muitos empreendedores, principalmente agora, em tempos de crise. Enquanto muitos setores seguem as operações com percentuais desanimadores de crescimento, o varejo farmacêutico continua em um ritmo invejável. O que muitos desconhecem é que gerir uma farmácia significa estar fortemente atrelado a inúmeras exigências regulatórias. 

Além das normas que todo estabelecimento comercial precisa seguir, como Código Civil, Código Penal e Código de Defesa do Consumidor (CDC), as farmácias precisam estar em dia com uma série de leis que tratam especificamente da atividade no varejo farma. 

De acordo com o advogado e consultor jurídico da Associação do Comércio Farmacêutico do Estado do Rio de Janeiro (Ascoferj) e da Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais (Anfarmag), regional do estado do Rio de Janeiro, Gustavo Semblano, a Lei Federal nº 5.991/73, que deve ser sempre analisada à luz da também Lei Federal nº 13.021/14, são as normas mais significativas, pois ditam os elementos essenciais para uma drogaria ou farmácia em relação ao direito sanitário.

A Lei 3.820/60 e as resoluções do Conselho Federal de Farmácia (CFF) também são de suma importância, pois estabelecem os pressupostos para a formação em farmácia, como ser um farmacêutico e as obrigações das empresas (como as drogarias) que necessitam ter um responsável técnico farmacêutico, etc.

Outro órgão muito atuante no cotidiano dos varejistas farmacêuticos é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável por estabelecer os procedimentos, boas práticas e demais condições para a fabricação e comercialização de medicamentos e correlatos, bem como os serviços que podem ser prestados em um estabelecimento farmacêutico. 

Além de a farmácia estar de acordo com todas essas exigências, o profissional responsável pelo ponto de venda também precisa seguir normas rígidas de atuação. “Conforme previsto no Código de Ética Farmacêutica, regulamentado pela Resolução 596/14 do CFF, o farmacêutico, durante o tempo em que permanecer inscrito em um Conselho Regional de Farmácia (CRF), independentemente de estar ou não no exercício efetivo da profissão, deverá exercer a profissão farmacêutica respeitando os atos, as diretrizes, as normas técnicas e a legislação vigente, e assim deverá cumprir com todas as normas sanitárias e profissionais inerentes de sua atuação profissional, não havendo uma legislação principal”, detalha a coordenadora do Departamento de Orientação Farmacêutica do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP), Dra. Daniela Caroline de Camargo Veríssimo.


Diferentes esferas

A Constituição brasileira estabelece que cada ente estatal – União, estados, Distrito Federal e municípios – pode elaborar normas sobre determinados assuntos, sendo que a legislação federal é válida em todo o território nacional e as legislações estadual e municipal são aplicáveis somente na jurisdição onde o estabelecimento está instalado. “A Constituição Federal estabelece os limites normativos de cada ente federativo, e desde que observados os requisitos constitucionais e legais na elaboração de uma norma, ela deve ser cumprida”, explica a Dra. Daniela.

Ou seja, as normas de todas as esferas devem ser seguidas à risca, já que a legislação brasileira permite que a União crie regulamentações federais sobre determinados assuntos, e os estados, o Distrito Federal e os municípios sobre outros. Segundo Semblano, é difícil estabelecer uma hierarquia quanto à importância das leis criadas em diferentes esferas. “Por vezes, uma lei municipal tem mais relevância que uma lei federal, quando trata de um assunto que a Constituição diz que os próprios municípios devem fazer.”

De olho na fiscalização 

Por ser um dos setores mais fiscalizados no País, é comum que farmácias sofram ações de fiscalização, de diferentes órgãos regulatórios. “Pode ser uma fiscalização metrológica [Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro)], trabalhista (Ministério do Trabalho), sanitária (Vigilância Sanitária), farmacêutica (CRF), tributária (Receita Federal, Estadual ou Municipal), entre outras”, enumera Semblano.

No caso de fiscalizações específicas do setor, o fiscal do CRF, em cumprimento da Lei nº 3.820/60, busca avaliar se, no momento da inspeção, o estabelecimento conta com a presença de um farmacêutico, exigência determinada pelas Leis nº 13.021/14 e nº 5.991/73, além de verificar o cumprimento das normas sanitárias e profissionais vigentes. 

“A fiscalização do CRF-SP atua de forma a garantir o direito legal da população de ser assistida por um profissional tecnicamente habilitado, o farmacêutico, capacitado a orientar quanto ao uso correto e racional de medicamentos. Assim, também, caberá ao fiscal do CRF-SP avaliar se as atividades privativas do farmacêutico são outorgadas a outros colaboradores não legalmente habilitados, em contrariedade à legislação vigente”, relata a Dra. Daniela. Caso a farmácia esteja em desacordo com algum dos itens avaliados, o fiscal orienta os farmacêuticos a alterar procedimentos internos para a promoção da regularização.

Dentro da lei

Veja as demais normas que também devem ser respeitadas pelo varejo farmacêutico, além das regulações do setor de saúde: 

• Código Civil: regras de constituição de empresas, de contratos, de multas, juros e indenizações.

Código Penal: regras sobre crimes contra a saúde pública, de falsidade documental, de falsidade ideológica.

• Código de Defesa do Consumidor (CDC): estabelece as regras para as relações entre as drogarias e os consumidores, como as relativas a medicamentos vencidos, medicamentos com defeitos nas embalagens internas ou externas, troca de produtos.

Punições previstas

Com base na Lei nº 3.820/60, cabe ao CRF-SP “fiscalizar o exercício da profissão, impedindo e punindo as infrações à lei, bem como enviando às autoridades competentes relatórios documentados sobre os fatos que apurarem e cuja solução não seja de sua alçada”. Ou seja, quando as infrações encontradas forem correspondentes à atuação do CRF-SP, o órgão poderá promover autuações ao estabelecimento. “Por exemplo, quando farmácias e drogarias são flagradas em atividade sem a presença de farmacêutico, estabelecimento sem registro e sem responsável técnico junto ao CRF-SP”, especifica a Dra. Daniela. 

Já quando ocorre a constatação de irregularidades que não são de competência do CRF-SP, os fatos são encaminhados para outras autoridades a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis (vigilâncias sanitárias, Anvisa, autoridades policiais, Ministério Público, etc.). As punições estabelecidas por esses órgãos variam. “Depende da legislação, mas, normalmente, redundam em multas e até interdições de drogarias”, destaca Semblano.

É preciso ressaltar também que, além do cumprimento das normas específicas do setor farmacêutico, o estabelecimento precisa cumprir todas as demais legislações que afetam a atividade comercial em geral. O descumprimento de normas, seja na área trabalhista [Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)], como do consumidor [Código de Defesa do Consumidor (CDC)], também pode acarretar penalizações pelos órgãos reguladores. “Estão previstas não apenas punições por órgãos de fiscalização trabalhista ou consumerista (Procons), como ações trabalhistas e ações indenizatórias de consumidores”, alerta Semblano. 


Não corra riscos

Cumprir todas as exigências obrigatórias da gestão de uma farmácia pode parecer uma tarefa trabalhosa. De fato, é, mas os ganhos de se estar em dia com as normas legais são muito maiores, impactando, inclusive, na fidelização de clientes. “A empresa que cumpre com as legislações evita penalizações por parte de órgãos de fiscalização competentes e garante que os serviços e produtos oferecidos estejam de acordo com o preconizado nas normativas, de forma que o paciente tenha a garantia de qualidade dos produtos e serviços adquiridos”, garante a Dra. Daniela.

Como a regulação é intensa, o varejista pode buscar auxílio profissional para se certificar de que todas as exigências estão sendo cumpridas. “As informações devem ser obtidas com um advogado preparado, capacitado e que entenda da legislação objeto do questionamento do dono da farmácia, assim, será possível trabalhar com tranquilidade e certeza de não sofrer nenhum tipo de punição”, recomenda Semblano.  

Documentos exigidos

Para a comprovação da regularidade do estabelecimento frente às normativas sanitárias e profissionais, durante inspeção da fiscalização do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP), o fiscal do Conselho solicitará e analisará os seguintes documentos:

• Contrato social, Registro de firma individual ou Estatuto/Lei de Constituição da unidade e respectivas alterações contratuais (quando houver);

• Licença/Protocolo de Funcionamento expedido pela Vigilância Sanitária para o exercício vigente;

• Autorização de Funcionamento de Empresa (AFE) expedida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), quando aplicável;

• Certidão de Regularidade expedida pelo CRF-SP;

• Manual de boas práticas e procedimentos operacionais;

• Autorização Especial (AE), cadastro e movimentação junto ao Sistema Nacional para Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) (quando aplicável).

Fonte: Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP)


Autor: 
Flávia Corbó

Mercado ilegal de medicamentos

Edição 275 - 2015-10-01 Mercado ilegal de medicamentos

Essa matéria faz parte da Edição 275 da Revista Guia da Farmácia.

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