Consumidores mais exigentes

Pesquisa global aponta mudanças no estilo de compra do consumidor brasileiro e mostra um novo perfil do shopper no País, que recorre cada vez mais a métodos on-line para analisar preços e produtos

Saber exatamente o que o consumidor deseja; a hora exata em que ele estará no ponto de venda (PDV) e o que ele comprará e o principal: o quanto está disposto a gastar. Tópicos que todo varejista gostaria de saber com precisão, para poder oferecer o melhor produto, com atendimento preciso na hora e com o preço que o shopper deseja.

Vive-se um dos momentos mais desafiadores da economia brasileira, em que todos os setores do mercado de bens de consumo – fabricantes, varejistas e, sobretudo, os consumidores – estão sendo impactados e apertando ainda mais o bolso. O contexto incerto faz com que a confiança de consumo, que é moldada por expectativas do presente e do futuro, fique abalada. 

Segundo a Nielsen, nove a cada dez brasileiros acreditam que o País se encontra em recessão econômica, 43% deles já estão endividados ou inadimplentes e mais de três milhões de pessoas ficaram desempregadas em 2015, sendo mais da metade chefes de família.

Uma das maneiras de saber os hábitos dos consumidores neste cenário atual é analisar dados de mercado. E eles dizem muito sobre o que os clientes procuram e querem e quais ferramentas utilizam para satisfazer seus desejos.

Realizada em março último, a pesquisa Total Retail 2016, desenvolvida pela PwC, em parceria com a Research 2 Insight, apontou as mudanças na jornada de compras, que a cada ano vem desafiando o varejista e faz com que ele tenha de se reinventar constantemente. O consumidor está cada vez mais exigente e dinâmico, valorizando a credibilidade e a experiência de compra, desafiando o varejo a ter sempre o menor preço.

De acordo com o levantamento feito com 22 mil consumidores, de 25 países, 38,2% dos brasileiros possuem o hábito de fazer compras on-line todos os meses; número maior dos que preferem a loja física (30,9%). Apenas 3,4% dos entrevistados nunca fizeram compras on-line.

O método preferido é o computador (34,4%); 15,3% utilizam os smartphones e 15,8%, os tablets. 

A pesquisa de preços – se on-line ou em lojas físicas – depende do tipo de produto que se quer adquirir, como, por exemplo: eletrônicos, livros, cosméticos e artigos esportivos são mais procurados on-line, já vestuário, decoração e material de construção têm a loja física como preferência na hora da pesquisa.

Entre os itens de saúde e beleza, 28% preferem pesquisar em lojas físicas, 56%, on-line e apenas 8% não pesquisam. Já quando o assunto é efetuar a compra, 40% recorrem à loja física, praticamente empatado com a loja virtual (45%). 

A pesquisa também apontou que o preço é fator predominante para os brasileiros na hora da compra (53,8%), entre loja física e virtual. Além disso, para 58,7% dos entrevistados, o bom preço é o que mais pesa na hora de decidir pelo varejo da preferência, seguido pela confiança da marca (44,6%). 

Mudança no mercado

E é diante desse novo comportamento, mais planejado e mais decidido a fazer escolhas para equilibrar o orçamento, que a Nielsen, na nova edição da análise anual Mudanças do Mercado Brasileiro, estudou os cinco fatores essenciais sobre o consumidor, de curto e médio/longo prazo, para que os fabricantes e os varejistas se adaptem à dinâmica atual, saiam fortalecidos do cenário atual e vençam nos próximos anos. 

1º. Está mais atento a preço: acertar na execução das estratégias de preço se torna ainda mais crucial em períodos inflacionários. “Na busca por custo mais baixo, observamos que o consumidor vai à loja e ao encontrar um preço mais alto, logo busca referência em outros itens da gôndola (concorrência) para compreender a nova realidade, comparando os valores”, diz a analista de mercado da Nielsen, Tatiene Vale.

2º. Troca conveniência por economia: para não perder os benefícios conquistados nos últimos anos e tendo o preço no centro do planejamento, os consumidores adaptam suas missões de compra buscando mais abastecimento no Atacarejo (Cash&Carry). Lojas de vizinhança assumem um papel de extensão da despesa da dona de casa.

3º. Está disposto a trocar de marca: a análise revela que 41% das marcas líderes retraíram volume de vendas em 2015, sendo que seis das top dez marcas líderes perderam lealdade. “Com um consumidor menos fiel, é imprescindível trabalhar três pilares para chamar sua atenção e conquistá-lo: execução correta no PDV, tanto em preço quanto em disponibilidade de produtos; focar em inovações que apresentem uma clara relação de custo-benefício, especialmente voltadas à saúde e ao bem-estar; e manter aquecidos os investimentos de mídia, condicionando a lembrança constante e estabelecendo vínculos com o consumidor”, explica o analista de mercado da Nielsen, Lucas Bellacosa.

O gerenciamento de estoques tem sido o principal responsável por indisponibilidade de produtos na área de vendas da loja, saindo de um patamar de 3,5%, em 2014, para 4,6% em 2015. E a execução das ações em loja é tão relevante quanto a mídia proposta para chamar a atenção – ambos os fatores somados contribuem com 15% do incremento de vendas das categorias de bens de consumo nos últimos sete anos. 

4º. É conectado e não abre mão do que gosta: outra força de consumo que já é realidade, e que não deve sair do radar de fabricantes e varejistas, são os Millennials (geração de 21 a 34 anos de idade). “A população de Millennials no Brasil já ultrapassa o total da população da Espanha e deve atingir um potencial de consumo de mais de R$ 75 bilhões até 2019”, destaca Bellacosa. Trinta e sete por cento dessa geração diz que não pretende economizar, pois gosta de viver o momento e comprar por impulso, não abrindo mão do que gosta, o que inclui produtos supérfluos. Eles também são 10% mais leais às marcas líderes e estão cada vez mais conectados, em busca de novas tecnologias e utilizando mídias sociais para tomar suas decisões de compra. 

5º. Já considera o canal on-line como opção de compra: o comércio eletrônico vem ganhando aceitação no País e expandirá 43% em quatro anos. Embora o brasileiro já tenha cultura de e-commerce, o mercado de bens de consumo ainda apresenta oportunidades de desenvolvimento no Brasil, que hoje se destaca no meio on-line pela venda de produtos de Higiene & Beleza (83%).

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Mais conectados

A interação nas redes sociais vem crescendo ano a ano e sua influência nas vendas do varejo e no tráfego por referência é inegável. De acordo com a especialista de varejo e consumo da PwC, Patrícia Prado, a pesquisa Total Retail 2016 apontou que 58% dos consumidores brasileiros disseram que a comunicação por ofertas, análises e comentários de outros consumidores é um importante aspecto no momento da compra on-line. 

“A venda é o resultado dessa interação. Na pesquisa Total Retail 2016, 18% dos consumidores afirmaram comprar produtos pelas redes sociais. No ano passado, esse número era de 9%, aproximadamente”, destaca Patrícia.

É exatamente a partir desse relacionamento que o consumidor se aproxima da marca, pois vê nesse canal disponibilidade e interesse. “Essa é a melhor forma de chamar atenção: por meio da criação de um elo com o consumidor, estabelecendo uma via de mão dupla em que a marca tem voz – e ouvidos”, completa a diretora-geral de planejamento da HouseCricket, Patricia Tavares.

Lições a ser aprendidas

Pela pesquisa realizada pela Nielsen, os três primeiros fatores (preço, missão de compra e lealdade), mais inerentes à conjuntura, demandam uma reação rápida; os dois pontos seguintes (Millennials e comércio eletrônico) devem ter espaço na agenda de fabricantes e varejistas, mesmo neste período de incertezas, para que saiam fortalecidos quando a situação melhorar. 

“Neste momento tão desafiador, a maior virtude será a compreensão profunda desse novo consumidor, a agilidade para aplicar a execução mais assertiva de curto prazo, mas sem deixar de consolidar a base de crescimento para o futuro”, concluiu Tatiene.

Para o diretor executivo da Associação Brasileira de Distribuição e Logística de Produtos Farmacêuticos (Abradilan), Geraldo Monteiro, é necessário entender o novo perfil do consumidor para se adaptar a essa nova fase. “Conhecendo esse perfil, o varejista pode se moldar, mas é preciso estar nos dois mundos – virtual e físico.” 

O que mais chama atenção nas pesquisas, segundo a especialista de varejo e consumo da PwC, é a forte tendência do uso dos dispositivos móveis pelo consumidor. Mais de 62% comparam uma vez, no período de um ano, usando o smartphone. 

“Existe, também, muita busca on-line antes do cliente ir ao PDV. Eles pesquisam a disponibilidade do produto em estoque, a loja mais próxima, o preço, etc.”, destaca Patrícia Prado.

O consumidor também preza pelas opções de entrega (na loja, em domicílio, ou seja, ele quer o poder de escolher como vai retirar o produto). “O shopper também está transitando mais pela loja, interagindo com o mundo físico e virtual ao mesmo tempo. A pesquisa Total Retail 2016 mostrou que 51% comparam preço da concorrência dentro da loja”, alerta.

De acordo com a Kantar Worldpanel, a presença de smartphones no Brasil aumentou 22%, entre os anos de 2014 e 2015, e os aparelhos transformaram o cenário do consumo no País ao colocar o poder nas mãos do consumidor: o resultado da combinação “conexão + consciência” é o “consumidor racional”.

Com isso, surge um consumidor mais exigente e bem informado sobre os produtos disponíveis no mercado, atento ao grande número de opções, o que o pressiona a fazer a escolha certa. Além disso, as opções cada vez mais personalizadas tornam a atitude de comprar mais racional, levando a uma avaliação do custo-benefício. 

Para a consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso, o consumidor atual gosta de atendimento atencioso e se for para comprar medicamentos, o que prefere é “ser cuidado e paparicado”. “Há ainda muitas dificuldades para o comércio on-line e o e-commerce. Fora as grandes operadoras, como Ultrafarma e Netfarma, os demais têm dificuldade na logística e operação que ainda no Brasil é muito precária”, avalia Silvia. 

Importância do talento no PDV

O que faz com que o shopper prefira a loja física à virtual, neste momento, segundo a especialista de varejo e consumo da PwC, é o conhecimento do profissional: 48% dos entrevistados não abrem mão de um atendimento personalizado. “Atendimento personalizado se torna referência, tanto para a loja de rede, quanto para a loja de vizinhança. Trinta e seis por cento dos entrevistados dizem que o pós-venda é essencial e o destacam como a grande diferença”, avalia Patrícia Prado.

O atendimento e orientação são as mais fortes necessidades de todos os novos consumidores, como acrescenta Silvia. “Para a compra de medicamentos, todos privilegiam a capacitação e orientação como melhor forma de atendimento. Apesar da internet, acham que a orientação do farmacêutico ou balconista com ‘olho no olho’ ainda é o melhor que lhes podem oferecer.”

Para os demais produtos da farmácia, Silvia explica que os mais velhos, acima de 30 anos de idade, ainda privilegiam a simpatia e o papo atencioso, não dando tanta importância ao preço. Já os mais jovens preferem a objetividade, agilidade e o preço.

Além disso, a consultora especializada em varejo farmacêutico destaca que: “Todos os clientes gostam de atendimento acolhedor e personalizado. Mas para as grandes redes, o objetivo é ‘time is money’, ou seja, atendimento educado, rápido e com bom preço. Para os médios, a coisa muda. O atendimento personalizado se sobrepõe à velocidade e muitas vezes até ao preço.”

A dica da especialista de varejo e consumo da PwC, para chamar atenção do shopper moderno, é que as farmácias e drogarias ofereçam palestras e curadorias sobre temas do dia a dia, como estilo de vida saudável, programas de saúde, etc. “Assim o varejista atrai nichos específicos e gera mais tíquete. O setor farma é bem evoluído, mas ainda tem grande potencial para crescer. As lojas personalizadas podem trazer mais conveniência, ainda mais se oferecerem um espaço de saúde”, finaliza. 

Hábitos na farmácia

As fraldas descartáveis têm atingido cada vez mais lares brasileiros e aumentado a frequência de compra, juntamente com creme dental essential care (cuidados básicos) e escova de dente. 

Vale destacar também algumas categorias que estão deixando a cesta do brasileiro em Higiene & Beleza (H&B) muito devido a tendências: produtos para barba têm entrado em menos lares, juntamente com alisantes de cabelo. Na contramão, crescem produtos, como ativador de cachos ou que auxiliam na busca de um look mais natural.

Fonte: executivo de atendimento e negócios sênior da Kantar Worldpanel, Vitor Henrique Francisco dos Santos


Autor: 
Vivian Lourenço

 

Esperança Ilusória

Edição 283 - 2016-06-01 Esperança Ilusória

Essa matéria faz parte da Edição 283 da Revista Guia da Farmácia.

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