Inimiga silenciosa

Se descoberta precocemente, a Degeneração Macular Relacionada à Idade pode ser controlada antes de causar a cegueira

A população brasileira está envelhecendo e segundo estimativas recentes de projeções populacionais, em 2050, 66,4 milhões de brasileiros terão 60 anos de idade ou mais. Diante dessa realidade, a Organização Mundial de Saúde (OMS) avalia que exista no Brasil cerca de quatro milhões de pessoas com deficiência visual e, aproximadamente, 1,5 milhão de cegos, sendo a grande maioria de idosos.

Principal causa da perda da acuidade visual a partir dos 50 anos de idade, a Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI) pode ser perigosa se não descoberta logo no início. A mácula é uma pequena área da retina responsável pela visão de detalhes e seu comprometimento por uma lesão degenerativa, que surge com a idade, é chamado de degeneração macular.

“É uma doença que acomete a área central da retina, chamada de mácula e que evolui com baixa de visão progressiva. É uma das principais causas de cegueira em pessoas com mais de 50 anos de idade. Alguns depósitos chamados de drusas, que são causados por deficiência no metabolismo da retina, são visualizados a partir de exames de mapeamento de retina. Esses depósitos são indicativos do início da doença, sem necessariamente evoluir para sintomas visuais”, explica o gerente médico do Centro de Estudos do Instituto Cema, Dr. Omar Massayoshi Assae.

A DMRI se apresenta de duas maneiras: DMRI seca ou atrófica e DMRI úmida ou exsudativa. “No caso da seca ou atrófica, que é a forma mais comum e mais leve da doença, e representa cerca de 90% dos casos, as drusas estão localizadas na região macular, área central da retina, e evoluem lentamente para atrofia, levando à perda da visão. Não existe hoje nenhum tratamento específico para DMRI seca, sendo necessária reabilitação com auxílios ópticos para visão subnormal. Já na forma mais grave da doença, a DMRI úmida ou exsudativa, existe uma neovascularização, ou seja, a formação de novos vasos sanguíneos ruins sob a retina, chamados de membrana neovascular sub-retiniana, e que leva a uma perda rápida e irreversível da visão. Para esse quadro, existem tratamentos com laser e injeção intravítrea, que impedem a formação dos novos vasos sanguíneos”, revela o Dr. Assae.

Segundo a oftalmologista responsável pelo setor de oftalmologia do HCor, Dra. Camila Ray, a forma seca da doença é menos grave e acontece ao longo de anos; já a úmida causa uma baixa de visão acentuada em poucos dias. “A úmida (exsudativa) forma uma membrana embaixo da retina, e a décima camada, a última camada, a de Bruch, se rompe e o epitélio não dá conta, então surgem diversas membranas. Fumantes têm probabilidade 6,6 vezes maior do que não fumantes de desenvolver a doença, pois apresentam oxidação dos tecidos da retina. Nos Estados Unidos, aproximadamente 1,75 milhão de pessoas são portadoras de DMRI avançada e, até 2020, esse número poderá chegar a três milhões. No Brasil, não há indicadores específicos a respeito, mas acredita-se que o número de casos em todo o mundo deverá triplicar até 2025, com o envelhecimento da população.” 

Desenvolvimento e tratamento

Pessoas de pele clara e olhos azuis ou verdes são propícias à maior incidência da doença, porém seu início e sua gravidade sofrem influência também de exposição solar; tabagismo; hábitos nutricionais nocivos e associação com doenças metabólicas e circulatórias, como o diabetes e a hipertensão arterial; histórico familiar; e dietas com baixo índice de antioxidantes. 

“A perda da visão central pela DMRI ocorre quando as células fotorreceptoras na mácula são afetadas. Inicialmente, os pacientes percebem um embaçamento no centro da visão ou distorção das imagens, mais especificamente durante tarefas que exigem a percepção de detalhes, como leitura ou escrita. O diagnóstico é feito pelo exame do fundo do olho realizado pelo oftalmologista. Outros exames auxiliares são utilizados no acompanhamento e diagnóstico da doença, como é o caso da tomografia de coerência óptica, não invasiva, conhecida pela sigla OCT (em inglês, Optical Coherence Tomography), e da angiofluo resceinografia, conhecida como retinografia fluorescente,” comenta o especialista em retina do Agora Oftalmologia, do Hospital Santa Cruz, Dr. Zenshi Ishimoto.

De acordo com a Dra. Camila, do HCor, após dilatar a pupila, o oftalmologista observa a presença de pintinhas amarelas, que escapam da camada de Bruch. “Não se sabe dizer por que e quando acontece o desenvolvimento da degeneração, não existem causas diretas, mas há fatores relacionados, como diabetes, obesidade, colesterol, histórico familiar, etc. No início, o acometido tem sintomas muito leves e não percebe, por isso não consegue ver alterações. Começa a ter embaçamento e quando chega ao ponto de ver uma mancha preta no centro da visão, a degeneração já está bem evoluída. Costuma ver linhas tortas, imagens distorcidas no centro e borradas. Para diagnosticar, fazemos também o teste de Amsler, constituído por linhas verticais e horizontais, como uma grade, para ver o estado da DMRI. Damos ao paciente o teste para ir acompanhando a evolução, para observar qualquer piora e controlar o desenvolvimento”, explica a Dra. Camila.

Para prevenir e ter o diagnóstico da doença antes que ela se agrave, é imprescindível a consulta periódica com o oftalmologista, que irá avaliar os exames necessários a ser realizados.

“A suplementação oral de vitaminas e antioxidantes, como luteína, vitamina C, E, betacarotenos e zinco, além do ômega 3, está indicada para algumas formas de DMRI, como maneira de prevenção para evolução da forma não exsudativa para a forma exsudativa. Os antioxidantes atuam como fator inibidor para retardar ou impedir a forma exsudativa da doença nos pacientes que têm predisposição genética. No caso da DMRI na forma exsudativa, existe tratamento com medicações aplicadas dentro do olho e, quando realizado precocemente, é possível prevenir a cegueira em muitos casos.”, adverte a especialista em retina do Agora Oftalmologia, do Hospital Santa Cruz, Dra. Tatiana Tanaka. 

Luteína no combate à DMRI

A luteína é considerada um carotenoide e é encontrada em vegetais de folhas verde-escuras, como couve e espinafre. Chamada de “vitamina do olho”, protege os olhos dos danos do sol e da oxidação.

“A luteína é um carotenoide presente na retina e possui ação antioxidante. Há uma relação da luteína com o aumento da densidade do pigmento macular, responsável pela filtragem e absorção da luz azul, atenuando o processo oxidativo e protegendo consequentemente a retina. Porém, ainda não há evidência clara de que a suplementação com luteína reduz o risco de progressão da Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI), sendo necessários estudos adicionais para comprovar essa correlação”, revela o farmacêutico pós-graduado em Pesquisa Clínica pela Harvard Medical School, Guilherme Andretta.

De acordo com os especialistas em retina do Agora Oftalmologia, do Hospital Santa Cruz, Dra. Tatiana Tanaka e Dr. Zenshi Ishimoto, a luteína atua como se fosse um filtro solar interno, protegendo a mácula dos efeitos da luz ultravioleta por reduzir a quantidade de luz e neutralizar as formas reativas de oxigênio produzidas tanto por estímulo luminoso quanto pelo metabolismo da retina decorrente da idade.

A luteína e zeaxantina são os únicos carotenoides encontrados na região central da retina (mácula lútea), onde a acuidade visual é aguçada, por isso a importância destas substâncias.

“Os carotenoides são uma família de compostos abundantemente encontrados na natureza. Dos mais de 600 carotenoides existentes na natureza, aproximadamente 20 estão presentes no plasma humano e tecidos, e seis são encontrados em quantidades elevadas, são eles: alfa-caroteno, betacaroteno, beta-criptoxantina, licopeno, luteína e zeaxantina. O corpo humano não é capaz de produzir estas substâncias e depende da alimentação para adquiri-las. Os carotenoides têm sido assunto de interesse da comunidade científica há muitos anos devido ao fato de que muitos deles se convertem em vitamina A no organismo. Mais recentemente, pesquisas têm demonstrado que os carotenoides atuam como antioxidantes, protegendo as células dos danos oxidativos”, esclarece o gerente médico do Centro de Estudos do Instituto Cema, Dr. Omar Massayoshi Assae.

Evidências mostram que os antioxidantes, não apenas a luteína, têm o potencial de aumentar a densidade do pigmento da mácula, responsável pela absorção e filtragem da luz, diminuindo a oxidação da retina e protegendo-a. “Cada vitamina tem uma dose diária recomendada. Isso é analisado em estudos na fase não exsudativa, na tentativa de que a degeneração não progrida”, diz a oftalmologista responsável pelo setor de oftalmologia do HCor, Dra. Camila Ray.

Para o farmacêutico Andretta, além da luteína, também existe uma grande importância das vitaminas A e C, que são obtidas pela alimentação e em polivitamínicos. “Elas possuem papel fundamental como antioxidantes, já que neutralizam a ação dos radicais livres, formas não estáveis de oxigênio, que promovem reações que causam a deterioração celular na retina. Além disso, estudos sugerem que o zinco também possui uma ação fundamental na prevenção da DMRI, reduzindo o risco de desenvolver a doença em até 21%. Sua ação principal é na estimulação do sistema imune, que é de extrema importância na manutenção da saúde ocular. O ômega-3 também parece auxiliar na prevenção da doença, já que possui ação anti-inflamatória e pode reduzir a inflamação local na retina, fator patofisiológico importante na degeneração macular.”


Autor: 
Renata Martorelli

 

Estrada do crescimento

Edição 290 - 2017-01-01 Estrada do crescimento

Essa matéria faz parte da Edição 290 da Revista Guia da Farmácia.

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