O uso de smartphone para navegar nas redes sociais pode causar perda de produtividade. Cabe ao gestor ter regras claras para isso não acontecer
Com o surgimento das redes sociais e a empolgação inicial, que levou muita gente a passar horas navegando entre perfis e posts, os gestores do universo corporativo não viram com bons olhos seus colaboradores perderem tempo de trabalho com bate-papo ou públicações que não faziam parte de suas tarefas. No início, era fácil simplesmente bloquear sites indesejados no computador corporativo, mas com a popularização dos smartphones, ficou mais difícil controlar.
O expert business coach da Sociedade Brasileira de Coaching Empresas, Rodrigo Collino, explica que há muitos dados controversos sobre o tema e pesquisas continuam sendo feitas. Por exemplo, existe um estudo de 2006 da Carnegie Mellon University mostrando que trabalhadores, que constantemente alternam entre tarefas – como usar ferramentas de chats e mensagens instantâneas de mensagens com assuntos não relacionados ao trabalho durante o expediente –, levam de 11 a 25 minutos para retornar às suas atividades principais, devido à mudança de contexto e tempo necessário para focar novamente na resolução de seu trabalho.
Por outro lado, estudo da Universidade de Melbourne, feito em 2011, mostrou que o uso de redes sociais no expediente resulta em aumento de produtividade de até 9% quando o tempo total dedicado a isto não ultrapassa 20% das horas de trabalho de um dia. Ou seja, para um expediente de oito horas diárias, passar mais que 1,5 hora navegando em outras águas já começa a afetar a eficiência de um funcionário. Isso se explica pela necessidade de pequenos intervalos ao longo do dia, que podem ser benéficos para estimular a criatividade e execução de tarefas. Essa regra vale para qualquer outro tipo de intervalo em que o funcionário se beneficie, não necessariamente o uso de redes sociais ou similares.
No Brasil, estudo realizado com 1,2 mil pessoas pela consultora em Recursos Humanos Eva Hirsch, em parceria com Cristina Panella Planejamento e Pesquisa e a agência LeadPix, em 2014, aponta que, apesar de os trabalhadores acreditarem não haver problema em acessar sites e aplicativos, como Facebook, Twitter, Instagram e outros, durante o trabalho, 71% deles acreditam que, quando os seus colegas acessam, perdem a concentração e o rendimento. Já 45% dos entrevistados reconheceram que as novas tecnologias atrapalham a concentração.
O fato é que as redes sociais são uma realidade e não podemos ignorá-las, assim como seu uso no ambiente de trabalho. Para o presidente do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), José Roberto Marques, nada como o bom senso para avaliar e se posicionar diante da situação.
“A postura do gestor deve ser no sentido de manter a produtividade. Em algumas áreas, o uso das redes sociais é imprescindível, como marketing, relacionamento com o cliente e comercial, porém o bom senso deve prevalecer”, endossa.
Segundo o especialista, o gestor deve delegar as responsabilidades e cobrar resultados e prazos, além de monitorar os processos de trabalho. Tudo isso implica em fazer a avaliação de desempenho e produtividade, ponderando os picos de distração, uso de redes sociais e navegação de sites que não condizem com a atividade profissional.
Para fazer essa análise, o gestor precisa levar em consideração a empresa em que está atuando. “Cada empresa deve conduzir esse processo de uma maneira, dependendo do seu porte, segmento, profissionais e público”, completa Marques.
Também é importante determinar o que é “uso permitido” e o que é “uso excessivo” das redes sociais. Collino aponta que ter as regras esclarecidas e comunicá-las desde o processo de seleção e contratação é essencial para uma equipe bem informada e focada. “Aqui, a capacidade do líder em comunicação e em promover eficiência da equipe estarão à prova, pois somente aqueles que conseguirem engajar seus liderados de forma ativa (ao invés de punitiva) trarão maior sucesso para a empresa e seus clientes.”
Para 29% dos entrevistados pela consultora Eva, a solução para acabar com as redes sociais no ambiente de trabalho seria a proibição, tanto do acesso às redes sociais quanto dos e-mails pessoais durante o experiente. Com punição grave, podendo acarretar até em demissão no caso de uma desobediência.
Mas a palavra proibir não está na moda entre os especialistas em gestão de pessoas. Collino aponta que a proibição só acontece quando o líder ou a empresa, enquanto organização, falham na conscientização e engajamento de seus colaboradores. “É possível proibir de maneira consciente, estabelecendo regras de disciplina e produtividade que sejam saudáveis para todos os envolvidos – e cada empresa tem seu ‘ajuste fino’ nesta questão em função da área, cultura e dos objetivos que lhe são relevantes.”
Marques concorda. Para ele, o melhor é a conscientização, e até mesmo a definição de um horário para o uso das redes sociais, se necessário. E lembra que, em algumas áreas como a de produção, o uso do celular deve ser proibido, uma vez que há um tempo da linha de produção e qualquer distração pode acarretar em atraso e até mesmo em um acidente.
Algumas empresas contam com a tecnologia para manter a produtividade do colaborador. O computador corporativo além de poder ser bloqueado, também pode ser monitorado. Já os celulares são aparelhos particulares, o que impossibilita bloqueios por parte da empresa.
Collino diz que o fator diferencial deve ser o capital humano e, portanto, trata-se muito mais de um exercício de desenvolvimento da liderança junto à sua equipe do que uso de artefatos tecnológicos para bloqueio de aplicativos em celulares daqueles que deveriam, em teoria, estar jogando pelo seu time, remando o barco na mesma direção.
“Se uma empresa está considerando usar esse tipo de tecnologia, recomendaria urgentemente uma reavaliação de sua missão, valores e capacidade de gestão e liderança frente a seus colaboradores”, ressalta Collino.
Atitude inevitável
Para ajudar o colaborador a entender até onde ele pode ir com as redes sociais, campanhas internas e até o manual do colaborador podem vir com orientações quanto ao uso das tecnologias. “Conscientizar o colaborador do seu papel e da sua responsabilidade dentro da organização é de suma importância, bem como os resultados que a empresa espera dele. Assim sendo, ele deve evitar distrações ao longo do dia, como as redes sociais, navegando em sites e até mesmo estendendo a pausa para o cafezinho”, reforça Marques.
Por outro lado, o especialista aponta que algumas empresas incentivam o uso das redes sociais como forma de divulgação, pois os clientes interagem com esse tipo de postagem. No entanto, essas ações devem ser feitas com cautela para não expor a organização de maneira negativa. Deve haver orientação e monitoramento quanto a isso.
Collino acredita que as campanhas podem variar bastante em função da criatividade da equipe de recursos humanos juntamente com o departamento de marketing, e devem considerar a linguagem mais adequada ao perfil do público em questão – geração Y, Z, ou um pouco de todos. “O importante é conseguir relacionar os dados que impactam diretamente os colaboradores, a empresa e seus clientes. Por exemplo, tempo perdido em celulares e redes sociais versus impacto na produtividade ao fim do dia, semana ou mês.”
No entanto, mesmo se com todos os esclarecimentos algum funcionário exagerar nas atividades que não estão relacionadas a seu trabalho, a postura do gestor faz toda a diferença. Collino diz que a regra da empresa deve ser igual para todos, comunicada desde a admissão do funcionário e por escrito.
O problema começa a existir quando o que se promete não é cumprido, então, quando o líder percebe alguém destoando do grupo, o correto é corrigir em particular por meio de uma conversa objetiva, transparente e construtiva, que traga mais consciência ao colaborador sobre suas atitudes e, depois, colocando-o como parte da solução.
O especialista sugere, por exemplo, que ele seja indagado da seguinte forma: “Tenho percebido que você está exagerando no tempo com atividades não relacionadas ao trabalho durante o expediente, e isto tem afetado x e y em seu desempenho, nossa equipe, meus resultados enquanto seu líder. Como você pode agir de agora em diante para evitarmos isto e conseguirmos resultados melhores?”. Por fim, é importante um acordo sobre as consequências do cumprimento ou não daquilo que foi disposto entre ambas as partes e acompanhar os resultados para estimular a mudança real de comportamento.
Marques também indica uma conversa individual com o colaborador que demonstrar baixa produtividade por excesso de distrações. Segundo ele, dar um feedback é fundamental, pois o colaborador pode não estar se dando conta do tempo gasto com esse tipo de atividade. “Sendo assim, oriente-o da maneira adequada, seguindo o padrão da empresa. Caso isso não seja o suficiente, o departamento de recursos humanos pode ser acionado para aplicar uma advertência ao colaborador, mas é importante que o gestor tente evitar esse tipo de punição.”
Peculiaridade do varejo
O uso do celular por balconistas ou atendentes do varejo pode trazer problemas, como distração e falha no atendimento. Para Marques, a falta de atenção quando o cliente se aproxima pode passar a impressão de desinteresse do atendente. “Ao utilizar o celular, o profissional fica de cabeça baixa, sua postura muda, o que pode fazer com que um cliente passe despercebido.”
Collino destaca que é difícil generalizar, por isso, é importante que o líder entenda o contexto maior e transmita a visão de seu negócio de forma inspiradora e positiva a todos de sua equipe e esteja sempre pautado em dados, indicadores de performance de sua equipe. “O combinado não sai caro nunca, e as empresas de maior sucesso são aquelas que conseguem admiradores em seu quadro de colaboradores, não apenas funcionários que seguem regras que são impostas de cima para baixo”, conclui.